Carta da Pré-Conferência Regional de Educação do Campo
No dia 23 de outubro de 2012, reuniram-se, no campus da Universidade Estadual de Maringá, em Maringá/PR, por ocasião da Pré-Conferência Regional de Educação do Campo, 36 participantes objetivados a debater a Educação do Campo quanto a sua concepção, significado e perspectivas, para reafirmar sua trajetória de luta pela efetivação do direito da população do campo à escola pública no Estado do Paraná.
Entre os participantes, contou-se com representantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST); educandos e equipe pedagógica da Escola de Agroecologia Milton Santos (Maringá/PR); Comissão de Mulheres do Sindicato Rural de Maringá; Sindicato de Trabalhadores Rurais dos municípios de Santo Inácio e Colorado; Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB); Centro Social Marista de Maringá; educadoras da Secretaria Municipal de Educação de Maringá (SEDUC); coordenadora da pasta de Educação do Campo do Núcleo Regional de Educação de Maringá; educadores do Colégio Estadual Felipe Silveira Bittencourt do município de Marialva/PR; educadores do Colégio Estadual João Farias da Costa de Nova Cantu/PR; representantes do Comitê Estadual de Educação do Campo; acadêmicos, técnicos e professores da Universidade Estadual de Maringá (UEM); representantes do Programa de Pós-Graduação em Educação da UEM; professores da Universidade Estadual do Paraná (UNESPAR) e da Universidade Estadual de Londrina (UEL).
No Estado do Paraná, serão realizadas diversas Pré-Conferências de Educação do Campo de caráter regional, a fim de articular as bases sociais dos sujeitos envolvidos com o campo; analisar, por meio dos relatos dos sujeitos sociais e históricos do campo e da educação, a conjuntura e a estrutura do campo, a situação das escolas e da Educação do Campo no Paraná; elaborar uma Carta Documento da Pré-Conferência Regional de Educação do Campo (Região de Maringá/PR); e, por fim, retirar os delegados que participarão da III Conferência Estadual
de Educação do Campo que será realizada nos dias 30, 31 de maio e 01 de junho de 2013, na cidade de Laranjeiras do Sul/PR.
Objetivou-se, nesta Pré-Conferência Regional de Educação do Campo:
(1) Reafirmar o conceito e o caráter da Conferência, visto que a Conferência é uma instância de participação social que comumente é convocada por um órgão público, com vistas a institucionalizar a participação da sociedade civil nas atividades de planejamento, gestão e controle de uma determinada política que foi ou precisa ser implementada em âmbito local, estadual ou federal. Neste espaço, ocorrem debates nos grupos de trabalho com a finalidade de discutir a respeito de temas específicos e elaborar, de acordo com os eixos determinados, propostas de políticas relacionadas ao tema da Conferência, e, posteriormente, encaminhado à etapa estadual. Além desse processo, é necessário eleger delegados que irão representar a sociedade civil participativa na Pré-Conferência, que estarão presentes na próxima etapa, que será Estadual ou Nacional.
(2) Realizar uma análise que problematize a situação da Educação do e no Campo, bem como a situação de vida e de trabalho dos trabalhadores do campo.
(3) Construir um documento referência desse evento, semelhante à “Carta de Porto Barreiro”, para que tenha força política. Neste documento, serão apresentadas as demandas para a Educação do e no Campo de modo a mostrar ao governo que os Movimentos Sociais do Campo estão se articulando pela garantia de políticas educacionais do e no campo no Paraná.
(4) Contribuir com o debate sobre o papel da Escola Pública do Campo no processo de Desenvolvimento Rural Sustentável.
Do balanço e das perspectivas da Educação do Campo na Região de Maringá - PR
Após a retomada histórica propiciada pela leitura da Carta de Porto Barreiro (PORTO BARREIRO, 2000), que lança luz à concepção, aos significados e às perspectivas teóricas e práticas da Educação do e no Campo no âmbito local e nacional, destacamos que este documento é tomado como eixo norteador da nossa Pré-Conferência. Entendemos que esta Carta é um dos principais instrumentos políticos construída histórica e socialmente no I Seminário de Estadual de Educação do Campo que pensou uma política estadual de Educação do Campo, refletindo a realidade século XXI no Estado do Paraná.
Iniciamos a Pré-Conferência Regional de Educação do Campo com a clareza de que este é um espaço político e pedagógico que possibilita a análise da Educação do Campo, apontando limites, diretrizes e ações de luta por políticas públicas que garantam às populações do campo o direito à educação no lugar onde vivem.
Dessa forma, constatamos que:
1. A conjuntura econômica e política existente no estado do Paraná marginaliza a educação dos trabalhadores do campo, contribuindo para o aumento de dificuldades com o planejamento de ações e projetos escolares, visto que a maioria das escolas apresenta um quadro de professores temporários. Como exemplo dessa situação, algumas escolas afirmam que não têm condições de transporte e deslocamento. Para solucionar esta questão, é urgente reivindicar junto à Secretaria Estadual de Educação do Paraná (SEED) uma política pública de incentivo à permanência dos professores nas escolas do campo, reduzindo a rotatividade desses profissionais, situação esta que atrapalha o encaminhamento político e pedagógico das escolas do campo.
2. É relatado pelos próprios sujeitos que há uma discriminação em relação ao camponês que se desloca até o meio urbano para estudar. Infelizmente, ainda existe a desvalorização do campo como território de saber em escolas urbanas e do campo. Dessa forma, é necessário que a importância da educação para os trabalhadores do campo seja trabalhada na educação urbana, para que os jovens do campo possam ser valorizados.
3. A migração do jovem camponês para os centros urbanos ocorre devido à busca de trabalho, abandonando, assim, o campo e demonstrando a desvalorização e a falta de incentivo para a permanência do sujeito em seu local de origem.
4. Existem denúncias de fechamento de escolas do campo, o qual impacta negativamente o desenvolvimento da Educação do Campo. Há um retrocesso educacional devido ao fechamento das escolas do campo, os governantes demonstram do lado que se encontram o agronegócio. Remetemo-nos a abordar essa questão, pois o que está em jogo é algo bem maior, a Educação do Campo como um direito do sujeito camponês e dever do Estado. Para suprir a demanda de alunos que frequentavam essas escolas, implementa-se a política do transporte escolar e da nucleação de escolas.
6. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) prevê que as escolas do campo adequem o ensino à sua realidade particular, porém esse processo apresenta dificuldades, a começar pela formação dos professores do campo, que, em sua maioria, ocorre em centros urbanos. Uma das soluções é pautar para a APP Sindicato e ao Estado uma política de formação e valorização continuada aos professores que atuam nas escolas do campo.
7. É necessário diminuir a burocracia para superar a lentidão com a qual as políticas são colocadas em prática, bem como aumentar o investimento financeiro. Necessidade de viabilização de projetos como o Curso de Pedagogia da Terra, da UEM e outros que preparam o professor para trabalhar no contexto do aluno do campo.
8. Promover parcerias entre a Secretaria Estadual de Educação (SEED) e as escolas de agroecologia existentes no estado do Paraná, a fim de investir e apoiar as práticas pedagógicas estratégicas de agroecologia no desenvolvimento tecnológico voltado à Educação do Campo, melhorando a qualidade de ensino e facilitando o acesso ao conhecimento sistematizado para os educandos.
9. Valorizar a Educação de Jovens, Adultos e Idosos do campo e garantir que seja implementada como Política Pública de Estado, sendo a mesma incluída no sistema EJA Campo.
10. Os Conselhos de Desenvolvimento Rural dos Municípios devem ser fortalecidos com o aumento de sua visibilidade e poder de decisão.
11. Alguns professores e diretores da rede pública estadual expuseram suas inquietações quanto à dificuldade em entender a proposta de Educação do Campo tal como a SEED colocou a situação, ou seja, somente distribuindo as resoluções e diretrizes do governo para os gestores e deixando nas mãos da escola e da comunidade o processo de troca de nomenclatura da escola. Por isso, o processo precisa ser institucionalmente coordenado pela Secretaria de Educação do Estado do Paraná (SEED) junto aos diretores, diretoras e
equipes pedagógicas do campo a partir de investimentos na formação continuada desses educadores.
12. Visando atender ao tópico 10, é necessário pautar uma agenda que amplie o diálogo entre as escolas do campo, comunidade e os núcleos regionais de educação. Inclusive, reivindicando ao Ministério da Educação (MEC) a criação de uma agenda nacional integrada para a Educação do Campo.
13. Evidenciou-se que o processo de construção histórica das políticas para Educação do Campo no Estado do Paraná encontrou uma série de questões irregulares, tais como: adequação do perímetro rural da cidade por arrecadação de IPTU; fechamento das escolas municipais do campo para oferecer o transporte; quadro docente temporário devido ao PSS.
14. Foi ressaltada a discussão sobre a ausência dos Núcleos Regionais de Educação nas questões práticas das escolas. A falta de formação dos gestores para lidar com a modificação das escolas não é uma escolha deles, mas da falta de ação do núcleo regional de educação. É o Núcleo que deve estabelecer reuniões para levar a compreensão da Educação do Campo para essas escolas, e não os gestores que devem ficar correndo atrás do entendimento. A função do Núcleo é dar o suporte para essas escolas.
15. Foram recordadas as dificuldades de negociação com a SEED no processo de reunião do Comitê Estadual de Educação do Campo. Além disso, constatou-se a desintegração do quadro de funcionários que trabalhavam com a Educação do Campo no governo do Paraná (2007-2010), realizado pelo governo atual, dificultando o processo de garantias por políticas educacionais de Estado para as populações do campo.
16. Na fala dos representantes dos Movimentos Sociais do Campo, presentes nesta Pré-Conferência, foi explicado que a dinâmica curricular das escolas do campo se relaciona com a importância de pensar a complementaridade do campo e da cidade, uma vez que a escola do campo não sobrevive sem a participação da cidade. Foi ressaltado, ainda, o significado da escola na formação da identidade dos indivíduos, a concepção de
educação ampliada que tem a Educação do Campo, a importância da comunidade e das políticas de estado, bem como a importância da participação da comunidade.
17. O conceito de Educação do Campo deve ter significado aos sujeitos do campo e no campo. Seu caráter de educação que visa ao processo contra-hegemônico da classe trabalhadora é urgente para: o rompimento com a situação nacional e global vigente, a formação integral do ser humano e acesso ao conhecimento historicamente construído e acumulado pela sociedade. E não pode, em nenhum momento, reproduzir a desigualdade que engendra sociedade capitalista.
18. Finalizamos nossas análises com o resgate de um sujeito histórico e social do campo que afirmou emocionadamente que toda conjuntura econômica, política e educacional atual mostra que o campo sempre foi inferior. Nesse sentido, deve haver uma parceria junto aos professores e de forma permanente para viabilizar a Educação do Campo. Os filhos dos camponeses, da agricultura familiar não querem mais ficar no campo, já que a escola tem incentivado as crianças a irem para a cidade. Existe um preconceito em relação a ser filho de agricultor que, por sua vez, produz os alimentos que suprem as necessidades da cidade. Deve haver a permanência conjunta da Educação do Campo e da cidade. Deve haver a valorização do campo, onde a escola é um dos elementos, porque não há escolas do campo num campo sem perspectivas, com o povo sem horizontes e buscando sair dele.
Diante dos objetivos desta Pré-Conferência, firmou-se o compromisso de elaborar e apresentar o conteúdo desta Carta na III Conferência Estadual de Educação do Campo, por meio dos delegados: Aparecido Calegari e Ivone Francisca de Souza (Sindicato Rural de Colorado), Caroline Mari de Oliveira e Rozenilda Luz Oliveira de Matos (Pós-graduandas em educação da UEM), Wagner Roberto do Amaral (UEL), João das Graças Oliveira e Maria Parolin (MAB), Adilson Vagner de Matos (MST/Escola de Agroecologia Milton Santos).
Assinam a Carta da Pré-Conferência Regional de Educação do Campo (Região de Maringá/PR):
Centro Social Marista de Maringá
Rosiany Maria da Silva
Abigail Correa Gonçalves
Alessandra Medina (Mandaguari)
Edson Reis da Silva
Lenira Sampaio Stubs
Lilian Cristina Marini Pepinelli
Cristiane Valéria Bósio Klein Leal
Kiomi Hirose (Professora Departamento de Teoria e Prática da Educação / GEPPGE)
Elias Canuto Brandão (Professor Departamento de Educação UNESPAR/GEPPPEC)
Grupo de Estudos e Pesquisas em Políticas Públicas e Gestão Educacional (GEPPGE) e Projeto 707/2003
Ana Paula Rosa da Silva
Caroline Mari de Oliveira
Darlene Novacov Bogatschov
Dominique Michèle Perioto Guhur
Elias Canuto Brandão
Irizelda Martins de Souza e Silva
Jani Alves da Silva Moreira
Kethlen Leite de Moura
Kiyomi Hirose
Maria Aparecida Cecílio
Maria Eunice França Volsi
Odair Antônio Fernandes
Rebeca Szczawlinska Mucieniecks
Rozenilda Luz de Oliveira de Matos
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST /Escola de Agroecologia Milton Santos)
Adilson Vagner de Matos
Aparecida do Carmo Lima
Márcia Gomes Pego
Natália da Silva
João das Graças Oliveira
Maria Parolin
Valkíria Trindade de A. Santos
Maria Eunice Carmonada
Rosilene Nascimento Polizeli
Ana Cristina do N. Versari
José Ulisses de Brito
Aparecido Calegari
Ivone Francisca de Souza
Elias Canuto Brandão
Vanderlei Amboni
Maria Regina Clivati Capelo
Wagner Roberto do Amaral
Ana Paula Rosa da Silva (Graduação em Pedagogia / GEPPGE)
Caroline Mari de Oliveira (Pós-Graduação em Educação / GEPPGE)
Francielle de Camargo Ghellere (Pós-Graduação em Educação)
Heliana da Silva (Laboratório de Apoio Pedagógico - LAP)
Irizelda Martins de Souza e Silva (Professora do Departamento de Teoria e Prática da Educação / PPE / GEPPGE)
Jeinni Kelly Pereira Puziol (GEPPGE / Professora do Departamento de Geografia)
Kethlen Leite de Moura (Pós-Graduação em Educação/GEPPGE)
Rebeca Szczawlinska Muceniecks (Pós-Graduação em Educação / GEPPGE)
Rozenilda Luz de Oliveira (Pós-Graduação em Educação / GEPPGE)
Maringá, 23 de outubro de 2012.
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