terça-feira, 30 de outubro de 2007

I ENCONTRO CIENTÍFICO DO CCH - COMEMORAÇÃO DOS 30 ANOS - 15 E MAIO DE 2007

EDUCAÇÃO E TRABALHO NA ZONA RURAL BRASILEIRA: RELATOS DE PESQUISA COLETIVA.


Irizelda Martins de Souza e Silva
Kiyomi Hirose
Maria Aparecida Cecílio
27/02/2007



Resumo

As políticas públicas para zona rural brasileira e as condições de vida do trabalhador que depende do trabalho na produção agrícola é objeto de nosso estudo para compreensão do atendimento ao direito a educação a todos os brasileiros. Na perspectiva de observar sistematicamente a ação governamental e dos poderes institucionais para efetivação de políticas públicas de educação, entendidas na amplitude do artigo 1º da Lei Federal Nº. 9.394/1996 analisamos o que de efetivo podemos indicar como política de estado para a formação de educadores, para e dos povos do campo e para proteção do direito a infância




UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ
DEPARTAMENTO DE TEORIA E PRÁTICA DA EDUCAÇÃO
ÁREA DE POLÍTICAS PÚBLICAS E GESTÃO EDUCACIONAL


Irizelda Martins de Souza e Silva
Kiyomi Hirose
Maria Aparecida Cecílio


POLÍTICAS PÚBLICAS E EDUCAÇÃO: EDUCAÇÃO E TRABALHO NA ZONA RURAL BRASILEIRA

Para pensar a educação como componente das políticas públicas no Brasil a partir da década de 1990, elaboramos uma orientação a nossa leitura para o momento de comemoração dos 30 anos de existência do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Estadual de Maringá, pontuando o que compreendemos por políticas Públicas e por indissocialibidade de direitos.
Compreendendo que uma política pública é uma política de Estado, portanto, vigora de fato e por lei, podendo ser acompanhada na efetiva prática social de atendimento a direitos, por parte dos poderes públicos, instituídos e legitimados por meio dos mandatos eletivos compostos para uma periodicidade planejada nacionalmente, o direito a educação passa a ser uma prática indissociável na condução das políticas nacionais.
A indissociabilidade dos direitos sociais compreendida como garantia das condições básicas de sobrevivência de uma população pressupõe que:
· O atendimento educacional não é uma fração de direitos que deva ser pensada por percentuais mínimos de investimento financeiro.
· Constitui-se como um direito fundamental a ser exercido pelo poder público por permear a vida em todas as suas dimensões.
Ao apresentar o conceito de política pública como política de Estado, estamos considerando que:
· O instrumento de acompanhamento que baliza os mecanismos sociais para leitura crítica da Educação no Brasil a partir da década de 1990 pode ser explicitado nos princípios fundamentais do ordenamento jurídico do texto constitucional brasileiro em vigor desde 1988.
A partir do texto constitucional brasileiro temos um leque de possibilidades de interpretação do termo “Educação” e a definição de competências dos poderes públicos como os grandes gestores das políticas de Estado. Nesse universo da doutrina legal do “Estado Democrático de Direito”, destacamos nosso objeto de estudo: “as políticas públicas para zona rural brasileira e as condições de vida do trabalhador que depende do trabalho na produção agrícola”, para compreensão do atendimento ao direito a educação a todos os brasileiros.
Na perspectiva de observar sistematicamente a ação governamental executiva e dos poderes institucionais para efetivação de políticas públicas de educação, entendidas na amplitude do caput do artigo 1º da Lei Federal Nº. 9.394/1996, assim versado:
A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais,
Analisamos o que de efetivo podemos indicar como política de Estado para a formação de educadores, para e dos povos do campo e para proteção do direito a infância, considerando o contido no artigo 2º: A educação [...] tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Para desenvolver a análise pretendida, consideramos como referencial as ações dos Estados federados realizadas no atendimento às políticas do estado nacional para sinalizar as características do que entendemos por políticas públicas a partir dos parâmetros legais.
Observamos os planos de ação dos estados no âmbito da educação do campo no intuito de conjugar a leitura do plano nacional de educação que delimita o tempo e o espaço das ações dos governos nas políticas de estado às efetivas ações nacionais. Exemplificamos fatos localizados da não garantia de acesso e permanência na escola da zona rural, registrando o que consideramos adequado para o momento: o desaparecimento da escola rural.
Demonstrando alguns traços característicos da identificação das formas de gestão pública às quais nos remetemos na compreensão das diferentes políticas percebidas no cenário educacional brasileiro contemporâneo, apresentamos um pequeno BOX com o que entendemos qualificar programas governamentais, políticas afirmativas e políticas públicas que envolvem a dimensão educacional da vida dos brasileiros no início do século XXI. Observamos que entre programas e políticas os dados não se entrecruzam:
PROGRAMA
POLÍTICA AFIRMATIVA
POLÍTICA PÚBLICA
Corpo seco
Fomento parcelado
Equidade
Auto-alimentável
Emenda orçamentária
Dirigida a seguimentos específicos
Não tem rédias partidárias
Gestão administrativa predominante
Temporária
É componente do orçamento público da união
Convênios temporários
Ação Intermediária
Tem prazo e mecanismo de avaliação constitucional
Ação compensatória

Amortecedor da política pelega

Tem legislação própria
Medidas provisórias de atendimento a demandas
Repostas às organizações sociais frente aos estatutos (leis intermediárias entre ações afirmativas e políticas públicas)
É fundamento constitucional
Criação por decreto
Configuram-se como políticas sociais
É política de estado
Rédias políticas

Atende a protocolos internacionais
Ações monitoradas


Espaço e tempo determinado administrativamente


Impacto determinado pelo governante proponente do programa





COMENTÁRIOS:
Conforme informativo de n. 149/2007, do INEPE , 45% - das
Escolas do Brasil são rurais enquanto que 90% das matrículas do ano de 2006 são urbanas, apontando para uma incoerência política.

O que se pressupõe para essa leitura?
Recuperando pressupostos para compreensão dos dados coletados para o senso escolar de 2006, relembramos as ações propostas na esfera federal para garantir políticas públicas para formação de professores:

Uma pesquisa do MEC divulgada em 2003, para elaboração do sistema nacional de formação continuada e certificação de professores, publicada como matriz de referência por meio do MEC – secretaria de educação infantil e fundamental sob o tema: toda criança na escola (p. 29), tabela 2, informava que:
· 2000 professores foram entrevistados por regiões, demonstrando as respostas dos entrevistados para justificar a criação do programa.

· constatamos na publicação de lançamento da proposta um total de 1745 professores entrevistados na zona urbana, correspondendo a 87.3% das respostas obtidas durante a investigação.

· na rural, 255 professores foram entrevistados, representando um total de 12.8%, significando a falta de observância para a necessidade de paridade na pesquisa.

Observamos destes dados que as ações não são de políticas públicas e sim de programa governamental. Falam de e por políticas, mas enunciam propostas de programas nem sempre executados ou se executados, sofrem avaliações técnicas.

Constatamos o “ocultamento” de políticas públicas para educação do campo. O “ocultamento” representado por silêncio constitui espaço de políticas intermediárias, denominadas ações afirmativas, realizadas mediante a mobilização social das organizações civis e em “certa medida” configuram políticas sociais de presumida importância no controle social de demandas de atendimento a direitos educacionais.

Também observamos que, se 45% das escolas brasileiras são rurais, a justificativa para um programa nacional de formação de professores não encontra fundamento na realidade estatística publicada no Informativo n. 149 do INEPE/2007 assim como não encontra na proposta nacional idealizada para ação governamental de formação de educadores com base de informações 87 % urbana, significando limite de elaboração de políticas públicas dado o fato de que os dados não se entrecruzam. A questão é: O que justifica um programa considerando a unidade nacional na diversidade campo/cidade?

Fatos recentes explicam a falta de investimento nas escolas rurais e por esse motivo apresentamos como exemplo. No município de Maringá há posicionamento da gestão pública, contrário a manutenção e investimento nas unidades rurais, conforme publicado em “o diário do norte do Paraná”, no dia 03 de maio de 2007, pág. A3. Nos argumentos do secretário municipal de educação “Manoel Gomes”, - “o êxodo rural é inevitável e é uma tendência nacional. mais cedo ou mais tarde esses alunos vão acabar vindo estudar na cidade.” admite ainda que “a administração investe menos nas escolas rurais por causa do baixo número de alunos”.
Em dados gerais, a secretaria de educação informa à imprensa que no município de Maringá, existem 10 escolas rurais e distritais no ano de 2007 (assim definidas por usarem transporte escolar). Entendem que, em tese, o município possuiu apenas duas escolas rurais: João Gentilin e Victor Beloti, localizadas nas estradas Pinguim e Venda Duzentos. Na Victor Beloti há oferta de educação infantil e ensino fundamental, perfazendo um total de 211 alunos.
Na João Gentilin, o esquecimento da gestão pública demonstra as conseqüências, como por exemplo, alunos que percorrem 12 km para chegar em escolas da zona urbana de Maringá para garantia constitucional do ensino fundamental. São números de registro do êxodo rural-educacional denotado pela falta de manutenção da infra-estrutura e em investimento geral, o que leva a população da zona rural a mobilização diante do número de 70 alunos que ainda permanece resistindo a falta de garantias.
No entendimento dos pais, os problemas vividos são expressos como:
Qualidade diferenciada de ensino;
Falta de oferta de reforço escolar;
Existência de biblioteca em local inadequado (funcionando na sala de aula);
Oferta de aula só no período matutino;
Descaso do poder público para as necessidades de reforma predial
Ausência de supervisores e orientadores
Diferença de investimento entre ensino do campo e da cidade
Prevalência da visão empresarial (de investimento financeiro) frente a direitos educacionais
Desrespeito à infância no direito a educação em localidade próxima a sua moradia
Os pais não são ouvidos como contribuintes que avaliam a necessidade de manutenção das escolas rurais.

A ESCOLA E O TRABALHADOR: Um direito ou um castigo

No Brasil desde tempos mais remotos como o período colonial, a escola é negada ao trabalhador como um direito e apresentada como uma possibilidade de profissionalização aos poucos que ofereciam a força de trabalho que interessava. A vida das famílias de trabalhadores que se mantém na escola é motivo de grande feito para um povo que não tem a escola como direito. Considerando que a criação de instrução pública no período imperial atendia as aspirações dos contribuintes consumidores de carne fresca de garantirem a permanência das famílias nas redes de poder e ao mesmo tempo servia aos interesses de juntar crianças abandonadas e relegadas a própria sorte das ruas e praças em instituições de ofício, torna-se prudente lembrar que a dualidade ai presente, nos dias atuais retratam as transformações do pensamento educacional oficial sobre a finalidade da educação.
A república encontra na escola, nos tempos de urbanização, o instrumento de controle social mais eficiente no contentamento dos donos de fábricas e dos proprietários dos latifúndios, também como forma de institucionalizar o lugar da criança segundo sua situação econômica.
Se pobre vai para fábrica como instrumento e trabalho, para escolas agrícolas, se rica vai para os bancos escolares urbanos. Outros tipos de instituições são criados ao mesmo tempo para garantir que as ruas e as praças republicanas não fossem mais lugares de infância. As instituições de recolhimento dão conta de estrangular a infância e a adolescência não ocupada nas fábricas e nas grandes fazendas e que também não podem ocupar ruas e praças.
Nos tempos modernos, infância e escola não se entrecruzam necessariamente. Crianças diferentes possuem vidas distintas, mundos distintos. Obrigações e deveres para as trabalhadoras X o direito ao estudo e lazer.
Essa dualidade social que no fim do século XX continua a significar a negação do direito a formação escolar a todos os brasileiros. Continua a nos oferecer argumentos para pensar a escola. Qual o significado de escola para uma comunidade que assisti o desmantelamento das escolas rurais que atendem seus filhos e netos? Será que representa para os governantes um direito a cidadania ou apenas um lugar de recolher crianças para que não fiquem nas ruas?
Sabemos que na zona rural brasileira são raras as escolas que ainda existem e quando resistem ao tempo e falta de investimento. A transformação destas unidades em instituições distritais distribuídas às margens das rodovias para atender ao transporte escolar de professores são motivo de impossibilidade da criança trabalhadora em freqüentá-la.
Relembrando a criação do sistema educacional brasileiro oficializando a escola como lugar de infância e adolescência não ficamos livres daquelas outras instituições similares mais com objetivos não apenas de guardar ou preparar as crianças e os adolescentes para o trabalho, mas de punir pela falta de direitos a liberdade e ir e vir pelas ruas e praças.
Quais argumentos buscar para procurar compreender o espaço escolar como espaço de direito legal e humano.
Para Reimer,
A educação escolar é uma forma quase perfeita de imposto regressivo, pago por pobres para beneficiar os ricos. Escolas são sustentadas, principalmente, por tributos gerais que, no final, recaem mais sobre as classes menos favorecidas do que sua incidência direta poderia sugerir. (21)

A escola é um mero instrumento do controle da cadeia de produção, interessa a uma pequena população que explora a força de trabalho nas condições adequadas pela escola, ou quem sabe nem isso.
Reimer diz mais:
Os economistas do desenvolvimento arrazoam que os camponeses da índia, os lavradores do Alabama e os lavradores de pratos do Harlem não carecem de maior educação até que o mundo seja preparado para absorvê-los em melhores ocupações, e estas só podem ser cedidas por outros a quem, assim, deve ser dada prioridade educacional. (23)

Se na década de 1950 e 1960 Reimer analisava as escolas como um lugar de eleitos, o que diria das escolas brasileiras criadas a partir da década de 1960, momento em que as montadoras multinacionais fincam pé em território brasileiro? Os vinte anos que se seguiram nos mostraram que a seletividade para o ingresso escolar tornou-se implacável, principalmente para com a população rural e suburbana. E para os eleitos que tratamentos foram dedicados?

REFERÊNCIAS
BOLTEM INFORMATIVO DO INPE – 2007
MATRIZES DE REFERENCIA- DOCUMENTO PARA DISCUSSÃO DO SISTEMA NACIONAL DE FORMAÇÃO CONTINUADA E CERTIFICAÇÃO DE PROFESSORES, PROGRAMA: TODA CRIANÇA APRENDENDO – 2003. MEC – SEC. DE ED. INFTANTIL E FUNDAMENTAL.
BRASIL. Constituição Federal, 1988.
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, 1996.
REIMER, Everett. A escola está morta: alternativas em educação; tradução de Tony Thompson. Rio de Janeiro, F. Alves, 1983.
ARAPIRACA, José Oliveira. A USAID e a educação Brasileira. São Paulo, Editores Associados, 1982.

O DIÁRIO DO NORTE DO PARANÁ. P. A3, de 3/05/2007.

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